Cai na asneira de fazer um comentário numa rede social sobre o desperdício de dinheiro que foi a falta de critério na implantação de ciclovias e ciclofaixas em São Paulo. Para piorar respondi a um entusiasta do sistema cicloviário implantado em Sorocaba. "No fim de semana tem até congestionamento..." respondeu ele.
A palavra que pegou pesado foi "desperdício". 'Como assim ciclovia é desperdício?' A pergunta foi repetida em tom de sarro em várias postagens. Desperdício!? Pelo que se entende das postagens, se foi feito em nome do social então não é desperdício. Não mesmo?
Fiquei procurando como responder e cheguei a duas conclusões, a primeira sábia: não responder. A segunda, mais sábia ainda, procurar com calma um bom exemplo que possa explicar para os mais fanáticos porque mesmo a mais urgente ação social pode ser um desperdício de dinheiro público. E não demorou muito, lá veio um ótimo e terrível exemplo.
Juan Domingos Peron assumiu a presidencia de uma Argentina em 1950, recém saída da Segunda Guerra Mundial e riquíssima, com a maior reserva de ouro do planeta. Um dia Peron foi para a rádio e disse que estava caminhando sobre o ouro, que o povo não comia ouro, e que daria este ouro para o povo. De um país riquíssimo, a quinta economia do mundo, com índices sociais invejáveis, a Argentina se transformou no que é hoje, com seus 50% de pobres ou abaixo da linha de pobreza, uma economia completamente desajustada... O ouro? Ora o ouro! O que foi feito dele. Não importa para muitos, Perón é de esquerda (?) e tem que ser aplaudido.
Enfim, mesmo riqueza abundante não se deve desperdiçar, mas é difícil não cair em tentação. Amir Klink fala muito sobre desperdício, sobre a perigosa facilidade que vem com o ter em abundância.
O Brasil é o que é porque o nível de desperdício que temos por aqui é completamente absurdo, todo tipo de desperdício, de riquezas, oportunidades, no mal feito, no pensar errado, comodismo...
Talvez o desperdício que mais me incomode seja o de boas cabeças com boas e verdadeiras intensões.
Bicicleta é crucial para a transformação que se espera das cidades, está mais que provado. As razões são inúmeras, muito além das questões de mobilidade. Encher as cidades de ciclovias não resolve porque tem gente que não usa e provavelmente nunca usará uma bicicleta. Técnica de segurança no trânsito moderna também descarta o concentrar em ciclovias e ciclofaixas.
Num bairro com uma topografia muito acentuada, como a Pompeia, colocar uma ciclofaixa numa subida que elimina 95% dos usuários de bicicleta é de uma burrice sem tamanho. Implantar ciclofaixa em bairro com topografia acidentada, de classe média muito alta, onde o automóvel é regra social, sem comércio por perto, onde há pouco trânsito e só circulam meia dúzia de ciclistas esportistas, é ou não é desperdício? Brigar com todo um bairro comercial para facilitar a passagem alguns ciclistas vale a pena?
Responsabilidade social requer um cálculo bem elaborado de custo benefício de tudo, ou haverá uma boa possibilidade de desperdício de dinheiro público, que por sua vez é crucial para as urgências sociais que temos.
Não é porque tem viés social que investir desmesuradamente vai ajudar a resolver a questão. Neste nosso Brasil isto está mais que provado.
Tem que investir bem, pensando a curto, médio e longo prazo, com todas as variantes, pró e contra no cálculo,ou a possibilidade de desperdício será alta.
Boas intenções por si só são um bruto desperdício.
Seja pragmático.
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