A razão para ter parado em Roma foi ter sido incluído numa exposição coletiva de arte. A partir daí cresceu o sonho da possibilidade de vender algumas obras minhas no mercado europeu. Não saiu como imaginava, mas saiu e espero que tenha resultados futuros, o que parece provável.
Por que Roma? Porque lá tenho onde dormir e espaço para pintar e deixar algumas obras para ver no que dá. Como disse, não vendeu, mas os trabalhos tiveram uma boa recepção por parte do mercado que fizemos contato, com respostas bem positivas.
Toda esta experiência me fez mais uma vez olhar para trás. O que teria sido caso eu tivesse saído para o mercado de arte e trabalho fora do Brasil ainda jovem? Segundo o que dois amigos, muito experientes, me falaram num passado distante, eu teria tido uma vida de resultados mais certos, inclusive financeiros. Foi-se. Estou velho, mas ainda não morto.
Aposentadoria é uma merda! Mas você acaba tendo tempo de sobra para olhar o passado. Olhar o passado, não ficar se remoendo o passado, o que faço um pouco, confesso.
Um dos erros atávicos deste país, Brasil, é que nós, brasileiros, deixamos o tempo passar, deixamos as coisas se acomodarem. Eu, classe média, sou um brasileiro típico, não fujo a regra.
Um dos melhores momentos deste meu amadurecimento está sendo revisitar e revisar meus trabalhos como artista. A primeira exposição individual foi em 1981 e até 1990 continuei expondo, algumas individuais grandes, mas poucas vendas. Considerava o dito mercado de arte um saco e não tive a maturidade de abaixar a cabeça e entrar no jogo, o que foi um erro com reflexos inclusive na qualidade de meus trabalhos. Só agora tenho consciência disto. Maturidade.
Nesta longa e lenta revisão não precisei muito para tomar consciência e entender minhas limitações patentes, e as minhas qualidades, várias, peculiares. Passei um bom tempo corrigindo desenhos que considerava perdidos e fiquei bem satisfeito com o resultado. Amadureci!
Roma me fez olhar mais fundo para meus erros passados, que vão além do desenho ou pintura. "Não basta saber fazer, tem que saber comunicar", e com isto vender, e no vender fui um desastre. O trabalho teria crescido uma barbaridade caso deixasse de olhar para o umbigo e caísse na vida.
É inerente ao nosso ser, o aminal e mais ainda o humano, trocar, o que hoje se traduz também como 'vender'. Assim como é inerente a nós o ser aceito pelo simples fato que "unidos venceremos". Vender, comprar, ou trocar, por valores, monetáiros ou não. Os que mais trocamos são os não monetários, os humanos, este é o jogo essencial.
Eu fiz uma besteira sem tamanho na vida de tentar preservar minha pureza não entrando no mercado de trocas. Passei boa parte da vida tentando limpar os meus próprios diabos, os comportamentos sociais que eram impróprios ou inapropriados. Em outras palavras, me esforçando para crescer a alma, pensando bem diria 'seja lá o que isto signifique'.
Um dia me olhei no espelho e disse em alta e boa voz: "Idiota! Para com besteira!"
Em Roma me foi perguntado quem sou eu e o que pretendo (ou pretendi) da vida. Minha resposta foi imeiata, certeira e sem dúvida: "Ajudar os outros". O quem eu sou ainda não sei bem e não vai ser a maturidade que vai me mostrar, só vai me fazer aceitar.
Só se ajuda os outros se você estiver ajudado ou 'se ajudado'. Talvez português errado, mas pensamento correto. Se você não estiver centrado tudo não funciona bem, começando por você próprio e terminando nas trocas, as vendas e compras, o jogo básico do 'unidos venceremos' que sem ele ninguém ganha, repito. Diálogo! simples assim.
"Cala a boca Arturo!" ouvi muito pela vida, em palavras ou não, e deveria ter ouvido e agido. "Não interessa o que você fala, interessa o que você faz (e fez)", esta ouvi de minha mãe uma única vez de minha vida, o suficiente. Pura verdade. "No lo diga al pedo", dizem os argentinos. Certíssimo. Falamos mais besteira do que peidamos. "Que nojo!". Nojo? O que? O 'pedo', que é espontâneo e natural, ou a besteirada que vomitamos no dia a dia em nome da "verdade" em nome de ensinar as verdades aos outros? Fósforos anulam o cheiro. O estrago de uma besteira dita costuma não ser tão fácil de ser contornado, quando é possível contornar.
Comecei a ser gente quando calei a boca (pelo menos tento) e passei a ouvir mais (o que me esforço). Sentir-se gente traduz-se por equilíbrio. Equilíbrio! Ufa! Paz! Hoje sinto o prazer de afagar o equilíbrio, delicioso equilíbrio, e sua paz subsequente.
Unidos venceremos só funciona se os indivíduos forem bons, ou, joguem o jogo do coletivo do bom para fazer parte do unido. Aí entram as regras impostas; e dança ou não a cabeça do indivíduo. Quem sou eu?
A maturidade traz uma capacidade diferente no avaliar as situações. Quem amadurece bem cresce muito e só fica com raiva do por que não pensou e agiu melhor no passado.
É muito fácil cometer erros de avaliação, mais do que fácil, é praticamente uma regra social. "Uma mentira dita mil vezes tornar se verdade", dizia Goebbels, um dos homens de Hitler. Acertou na mosca. Começou com ele? Definitivamente não. Provavelmente surgiu muito antes do poder da igreja católica que hoje rege a vida de crentes e não crentes. Ninguém escapa do olhar de Deus. Vale para o social, o coletivo, e muito mais para o pessoal.
Nos mentimos milhões de vezes e muitas de nossas verdades são fruto deste repetir mil vezes, diria milhões de vezes, as mesmas besteiras. Para justificar o que aqui digo prefere Freud, Jung ou Pavlov, para começo de conversa?
Ou incapacidade de fazer uma avaliação apropriada que me levou aos erros passados? Disto não tenho dúvida. Meus princípios! ah! meus princípios - muitos idiotas diria. Avaliação apropriada só ocorre quando temos capacidade de um olhar amplo e neutro. Não era nem amplo e muito menos neutro, de boa fé quero eu. Com os valores que eu perseguia, "minta(-se) mil vezes". Foi impossível ter uma avalição correta, portanto obter os melhores resultados.
Me resta acreditar na minha boa fé, mas de boa intensão o inferno está cheio. Novamente me olho no espelho e vejo que meus 'valiosos princípios' foram aplicados em situações onde não eram aplicáveis, ou, não serviram para nada. Muito esforço no que não deu resultado.
Pelo menos consigo ver os meus erros, que obvio persistem, em muito menor grau, mas ainda estão aí. Maturidade!
Em Roma ouvi mais uma vez, quase como sempre nestes dias de redes sociais, teorias da conspiração. Um pensador político definiu bem "teoria da conspiração" como um resposta simples para um problema complexo. No dia seguinte fiquei pensando quando conspiro contra minha própria vida.
Último dia em Roma revi todas sete pinturas que fiz lá. As condições de trabalho não foram as melhores, mas reconheço que reclamo de boca cheia. Como tudo na vida, ficou claro que o olhar que tive imediatamente após terminar cada pintura é muito diferente daquela revisão final antes de voltar ao Brasil. Nem todas me agradaram como no momento do "terminei". O tempo transforma a realidade.
Pouco posso fazer agora, aqui no Brasil, com obras terminadas que ficaram em Roma. Espero que vendam. Deixo para os outros julgar. Do que fiz, aprendi, amadureci, simples assim, com algumas dores e prazeres. A vida é assim. Tudo mais é "no lo diga al pedo".
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