"Não vou poder receber vocês porque tem gente com Covid aqui" veio na mensagem de Ricardo pelo Whatsapp. Olhei bem o celular, fiquei triste por um lado e muito feliz por outro. 'Paz! Quer saber não vou fazer mais nada; foda-se o mundo, tenho direito a ficar quietinho', pensei me levantando da poltrona e dando uns passos para o computador. Ameacei abrir a tampa e ligá-lo, mas a necessidade de distância de tudo foi maior. Olhei em volta, vi as roupas estendidas secando no varal, dei meia volta e fiz o mesmo, para secar minha exaustão me deitei no sol que ainda batia na cama. Encostei a cabeça no travesseiro que arrumara apressadamente uma meia hora antes, cama esticada, sem dobras. Olhei por uns minutos o teto de madeira pintado de branco, a janela, o céu azul através dos vidros um pouco sujos da poeira que não para, deixei minhas pernas esquentarem deliciosamente no calor do sol das 11; e
preguiçosamente pensei em tirar uma soneca irresponsável. Neurose pura e boba considerar que sonecas antes do almoço são irresponsavelmente libertinas, só merecidas nas férias, longe dos afazeres da grande cidade. 'Tenho direito' e fechei os olhos. Acelerado como em qualquer dia normal, respirei fundo e procurei entender o 'e daí, agora o que faço?'. Com olhar perdido na beleza do azul céu chapado continuei com a nuca envolta e acariciada pelo travesseiro macio; alonguei a respiração, fechei os olhos para baixar o tonos. Tempo que não se define, quietude, quietude, aos poucos vou afundando num nada, soneca consciente do tempo. E tic-tac abro os olhos noutro quarto, o mesmo, mas em mares menos agitados. Olho o relógio, ainda falta muito para o almoço, foi uma soneca rápida, alguns minutos, valiosa; e sorrio. Mais um silêncio, olhos abertos para o mesmo teto branco sentindo feliz o rosto descontraído. Não por muito tempo. 'E agora?' me persegue, mesmo bem mais tranquilo. Viro para o lado, estico o braço até o chão e pego o bom livro que está em suas últimas páginas. Leio as últimas 20 páginas ou tanto. 'Até aqui foi mais divertido' converso comigo mesmo em voz alta.
O sol passa para trás do edifício e volto à sombra. Sigo lendo e começo a sentir o frio invernal nas pernas nuas. As páginas vão correndo como em qualquer livro que termina e fico um pouco frustrado. Fecho
o bom livro que vou recomendar, estico os olhos para o relógio junto da TV, hora do almoço. Coloco uma calça, camiseta para dentro, aperto o cinto, suéter, passo pela sala, máscara, carteira, chaves e saio para rua ainda iluminada pelo sol. Paro no meio do asfalto, estico o pescoço para o sol e finalmente consigo me desligar das obrigações, do dia, dos afazeres, olhos fechados sentindo o gostoso calor na pele finalmente descontraída. Me perco no tempo, no lugar, me perco de mim mesmo. Livre, finalmente livre. E tomo um susto com uma buzina. Abro os olhos e pelo para-brisa vejo uma menina sorrindo com um pedido de inveja "por favor, posso passar?" Dou uma risada livre, inconsequente, estico a mão num pedido agradecido de desculpas, saio da
frente e caminho para a calçada. Ela
movimenta o carro por trás de mim, dá um toquezinho gentil de buzina, eu olho e
ela deixa um tchauzinho de "fique feliz", e com seu carro desce a
rua. Eu acompanho. Finalmente comecei o meu dia de paz.
'Bom, o
que eu quero comer?
Paz..... palavra mágica!!
ResponderExcluir