sábado, 10 de agosto de 2019

Pedalar as estradas conurbadas ou a periferia

Acabei fugindo de São Paulo e de meus problemas antes que estourasse. Peguei a bicicleta e fui mais uma vez para Sorocaba pedalando. Em vez de pegar a Rodovia Castelo Branco, fui pedalando por dentro, na avenida quase plana que acompanha a linha do trem que passa por Osasco, Barueri, Jandira, Itapevi, última estação da CPTM, chegando até Mailasqui. Dali para frente mais 38 km até Sorocaba pedalando pelo ótimo acostamento deste trecho verde e tranquilo da Raposo Tavares. Muito melhor e mais tranquilo que imaginava. Quem me fez descobrir este caminho foi o Google Maps. Já conhecia parte do trajeto até o Shopping Barueri pela av. Altino Arantes, de onde se tem aceso à rodovia Castelo Branco, evitando sua área mais conurbada e sem acostamento, muito perigosa para ciclistas. A um milhão de anos fui pedalando para Bom Jesus do Pirapora pela Castelo, mas então era uma simples rodovia moderna com acostamento; não esta loucura de mil pistas e correria sem parar de hoje. Só depois de Santana do Parnaíba a Castelo volta a ser uma estrada normal e é possível pedalar num acostamento descente e seguro. O caminho que fiz desta vez é por , portanto tem carro, ônibus, caminhão, não tem acostamento, mas tem espaço para o pessoal desviar, e desviam, e o asfalto é limpo, sem restos de pneus de caminhão que furam pneus, o que é uma grande vantagem. 

Medão! Talvez não sem razão nós que vivemos no oásis da área central de São Paulo, o Centro Expandido, tenhamos medo de ir para a periferia. Num passado distante não tinha medo, hoje tenho. "Será que serei assaltado?" eis o medão. Pensando racionalmente e lembrando o que me ensinaram - assaltante vai onde tem muita mercadoria (bicicletas e ciclistas) para assaltar; não fica esperando que passe um trouxa sabe-se lá quando - a possibilidade de ser assaltado enquanto cruzo a periferia é bem menor que ficar pedalando próximo da USP, por exemplo. Cruzei a periferia sem qualquer problema.

A pergunta que me fazem é porque não pegar um carro e começar o pedal onde a estrada é mais tranquila. Primeiro porque não tenho carro. Segundo porque estas estradas que hoje estão conurbadas e viraram avenidas fazem parte da minha infância e juventude. Passar por elas era sempre a certeza de um grande prazer, tanto pela paisagem quanto pelo que me esperava no fim da viagem. E finalmente, se quero construir uma cidade melhor tenho que entender sua verdade. Estradas conurbadas são as principais artérias da vida da cidade e hoje estão entupidas, maltratadas, perdendo sua função, com futuro incerto, qualquer que seja ele. Por que não ir lá em bicicleta para ver com calma como realmente estão e aí pensar, ou sonhar, o que se pode fazer para melhora-las? "É muito perigoso, muito tenso!" podem dizer, mas acho menos tenso e perigoso que pedalar numa ciclovia lotada em horário de pico aqui, em Londres, Munique ou Amsterdam, por exemplo. "É feio!", sim, é feio, mas é a realidade, ou melhor, está assim, não precisa ficar assim. "Tudo tem jeito, basta querer e realizar" repetia minha velhinha mãe. Estradas conurbadas são o cartão de visita e as boas vindas de qualquer cidade. Que cidade você quer? O que você sente na volta para casa quando chega de viagem internacional no GRU?

Não, não estou estimulando ninguém para sair pedalando em estrada conurbada como a Dutra, Castelo, Anhanguera, Raposo Tavares, de todas talvez a mais complicada. Quero deixar um pingo de curiosidade sobre como sair pedalando de São Paulo para o interior. Será que a única alternativa é o caminho dos carros? Minha resposta é negativa, não, não é. Tem caminho alternativo, tem trecho que dá para pedalar na conurbada, desmistificando dá para ir. Um mundo de ciclistas trabalhadores vão; por que nós não podemos ir?

A próxima vez vou repetir, depois de décadas, ir pela Estrada dos Romeiros, ou, Santana do Parnaíba, Bom Jesus do Pirapora, Cabreúva, Itu, Sorocaba, viagem de dois dias, um até Itu e os pasteis maravilhosos da Lanchonete Tonilu, ao lado da igreja Matriz, durmo, e dia seguinte sigo para Sorocaba, talvez pela estrada velha, sem Castelinho. 

Sair pedalando de São Paulo é um outro babado.

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