quinta-feira, 23 de março de 2017

Fechamento do MuBI: Brasil, um país sem memória

Fazia muito tempo que não sentia dor no peito, aquela dor profunda, imensa, dor de tristeza, dor de desalento. Ontem senti, hoje um pouco menos, amanha passa, diriam meus amigos. Nossa memória é curta, principalmente de quem é brasileiro.
Sexta-feira passada recebi a notícia que o MuBI, Museu da Bicicleta de Joinville, fechou as portas definitivamente. Valter Busto, o responsável pelo MuBI, foi avisado num dia para retirar a coleção praticamente no outro. Não sei exatamente o que aconteceu, qual a razão. Faz uns anos o museu também foi fechado depois de uma besteira tipicamente tupiniquim e depois de uma longa briga voltou a abrir. Desta vez acabou. Não interessa a cultura, não interessa o relativo sucesso do MuBI nestes 17 anos de existência, não interessa a preservação do passado, enfim não interessa e ponto.

O desrespeito com sua história é uma das marcas registradas deste Brasil brasileiro. A despreocupação com os museus pode ser medida na baderna e quase falência que atingiu o MASP, Museu de Arte de São Paulo, não faz muito tempo. Se o mais divulgado e famoso museu da cidade mais rica do país, 17% do PIB nacional, passou pelo que passou imagine o resto dos museus ou entidades de preservação da memória nacional vivem. Vide a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro só como mais um exemplo de tão vergonhoso é nojento. Nossas igrejas, palácios, fazendas, cidades históricas...
Conheci Joinville ainda quando tinha cara de Joinville. Era uma poesia. Hoje é uma cidade brasileira qualquer com uns resquícios da Joinville verdadeira. Quando começou a modernização (???), com a derrubada de antigas casinhas ou deformação de fachadas, dei uma entrevista numa rádio de lá e falei sobre a importância de preservação da linda e rica história da cidade e seus cidadãos. Não demorou muito a rádio começou a receber telefonemas, muitos deles ameaçadores. Neste contexto fechar um museu não significa nada, mesmo que Joinville tenha orgulho de ter sido a "cidade das bicicletas" com seus congestionamentos de bicicletas na saída da Fundição Tupi e ciclistas, homens e mulheres, pedalando por toda parte.

Na mesma sexta-feira estive em Piedade, interior de São Paulo, próximo a Sorocaba, para conversar com a escola de minhas sobrinhas netas. Quero ajudar na educação delas e achei que poderia oferecendo palestras ou conversas sobre o que está sendo feito com as cidades mundo afora. O coordenador da escola, Miro, inteligente, vivenciado em educação e viajado, colocou com sabedoria que mostrar outras realidades para aqueles pais de alunos "poderia" ser contraproducente. Talvez até ofensivo, entendi eu. Não duvido. Não se deve falar mal da cidade onde vivem - que é a melhor cidade do mundo, devem pensar. Já ouvi esta história muitas vezes, mas imaginei, melhor dizendo, sonhei que tinha mudado.
Brasileiro não aceita sequer comparações desfavoráveis, o que dizer de críticas. As cidades brasileiras são um desastre. Tirando raríssimas exceções, não tem personalidade, não tem história. Foram todas desintegradas em nome de um moderno, de um futuro, de um progresso pobre, mesquinho, sem sentido. 
Vários estudos apontam que a preservação da história de um povo é um dos melhores caminhos para a estabilidade social e que a memória é o caminho para o progresso sustentável. Aprendemos com erros e acertos. Mas quem de nós brasileiros se interessa?
Como brasileiros continuamos sendo usurpadores de uma terra. História? O que é isto? Para que serve? Principalmente, para quem serve?

Valter no MuBI
O fechamento do MuBI ironicamente acontece no meio do fervilhar do renascimento da bicicleta no Brasil. Quem se importa?
Querendo ajudar: Valter F. Bustos - val.bustos@hotmail.com 
Coordenador da EMem/MuBi, Vice-Presidente da ABAJO e Bike Jornalista
em Joinville/SC.


E agora ouvi na Rádio Eldorado na Crônica da Cidade com Antonio Penteado Mendonça: “Mundo brasileiro é dos malandros ou dos espertos”. Alguém tem coragem de negar? Quem se importa?













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