sábado, 17 de março de 2012

Ratos, treinamento, futuro



Ainda novo, na faculdade, nas aulas de pedagogia e sociologia, aprendi o óbvio que hoje estamos vivenciando intensamente no dia a dia: qualquer espécie viva precisa de um determinado espaço para viver e quanto mais adensado for o ambiente, mais tenso se torna a relação entre os indivíduos. A demonstração científica é simples: basta em um espaço determinado ir aumentando progressivamente o número de ratos. A condição individual e coletiva vai degradando até o ponto de ruptura social, com a consequente luta pelo espaço próprio de sobrevivência, ou seja, explosão da violência.

            Humanos tem um grau de adaptabilidade enorme, se comparado a outras espécies. Como espécie, chegamos onde estamos porque fomos capazes de organizar a vida comum através de treinamento e educação. Mesmo assim estamos passando por uma época de ruptura social de consequências ainda não definidas.

Até os animais passam por estes estágios de aprendizado. O primeiro está relacionado às habilidades físicas, hoje também considerada uma inteligência, que qualquer animal, incluindo da espécie humana, forma através de testes que chamamos de brincadeiras, o treinamento básico para a sobrevivência. A partir de um determinado estado evolutivo é necessário educar para tarefas específicas, o que nós, humanos, fazemos dentro de escolas e faculdades num trabalho mais mental, normalmente pouco prático. Outras espécies educam pela prática, como mostra qualquer documentário de vida animal.

            Trânsito, no sentido de movimentação de seres e objetos, é um dos sistemas de organização social mais básico. Mesmo um retardado profundo, com suas limitações claríssimas, aprende que tem que passar pela porta e não pela parede, e que para caminhar na rua tem que desviar dos obstáculos do caminho. É um aprendizado que parece simples, mas na realidade é muito complexo, dado a quantidade de informações aprendidas, e é feito através principalmente de treinamento de erros e acertos. Uma vez aprendido como “cruzar” as coisas sem se machucar o resto do processo é procedimento normalmente simples de ser assimilado.

            Qualquer um consegue se locomover no trânsito das cidades atuais por que é essencialmente uma questão física de sobrevivência. Um vira lata aprende a cruzar a rua e caminhar nas calçadas. Mas as movimentações aumentaram, se complicaram e sofisticaram a tal ponto se tornou necessário educar as pessoas para sobreviver neste caos controlado. As regras do funcionamento de trânsito, que existem a milênios, foram sendo desenvolvidas para facilitar a vida de todos e ser cada dia mais segura, como de fato é. Hoje as informações para os usuários das vias são simples, básicas, de fácil e rápida compreensão para todos; independente da capacidade mental.

            Adensamento do trânsito e consequente aumento de agressividade; mais tempo gasto em transporte e consequente perda de tempo de convívio; um sistema de comunicação digital eficiente, e cada dia mais portátil, que supre o tempo perdido nos deslocamentos, mas que reprime o treinamento do convívio humano, do partilhar, da sobrevivência coletiva. Chegamos à comodidade da individualidade desconectada de qualquer pressão de organização relacionada à sobrevivência coletiva. Grande parte da sociedade está ou no vício do automóvel e ou profundamente contaminada por seus traficantes. E novos vícios entranham a sociedade gerados pelo computador e sua inteligência artificial. Interessante a expressão “inteligência artificial”. Aumentar o número de ratos no mesmo espaço e dar-lhes uma inteligência artificial.

            Tendo justamente neste momento de crescimento urbano a beira do colapso, e tendo em vista que a educação formal, escola e faculdade, está cada vez mais rala, incipiente, e provavelmente ainda deve piorar, e que ainda não fazemos ideia no que vai dar esta formação mental gerada pela mídia eletrônica, só nos resta procurar uma saída para sobrevivência geral. Acredito que o caminho está em reorganizar a sociedade urbana através de um sistema simples, basicamente binário, permitido – proibido, vai – fica, o que já vivemos no trânsito. A responsabilidade de quem está envolvido neste meio é muito maior que possa parecer a princípio. É crucial. É dos poucos nós que oferece resultados à curto prazo e ser desatado com certa facilidade.


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