terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Santa Maria!

Marcelo Rezende, Cidade Alerta, com sua voz grossa, um tanto rouca, acostumado à barbárie, fez um dos textos mais emocionados, brutal, quando contou que depois que os corpos foram colocados no chão do ginásio os celulares dos mortos não pararam de tocar, numa sinfonia enlouquecedora. As autoridades presentes não podiam atender e tiveram que aguentar aquele contínuo tocar de campainhas e musiquinhas vindas do inferno de uma festa de boate.

Ainda não se sabe ao certo quantos morreram, mas mais de 231. Não há número final até porque muitos ainda vão morrer em consequência de queimaduras e problemas respiratórios. Neste caso vão contar todos mortos, incluindo os que vieram a óbito até 3 meses depois, o que normalmente não se faz.
A comoção é geral. Gaúcho não está acostumado a isto; não tem prática com morte fácil e banal. Ontem saíram em passeata nas ruas de Santa Maria 30 mil pessoas. Número impressionante para uma cidade que tem 300 mil habitantes. Dez por cento! Dez por cento.

Dizem que agora a coisa vai mudar. Dizem que vão colocar os responsáveis na cadeia. Quem, por quanto tempo? Será justo? Será abrangente? Vão pegar os mais óbvios por que disto não podem escapar.  Não há forma técnica judicial para desmanchar a teia criminosa completa. Todos são culpados e todos nós somos culpados por omissão. Não temos ferramentas para uma investigação de qualidade. Nós assim queremos por que passivamente aceitamos. “País de bananas!” alguém soltou na TV.
No meio de toda esta tragédia, um pouco mais de 230 mortos e mais uma centena de feridos, deve ter autoridade que está dando graças a Deus pelo desvio das notícias para um único foco. Afinal, como disse outro dia Alexandre Garcia no Bom dia Brasil, são 90 mil / ano vítimas de morte violenta, ou seja, mais de 240 mortos / dia. Faça as contas: quantos dias se passaram do incêndio de Santa Maria ocorrido no dia 27 de Janeiro de 2013? Agora multiplica por 240 e você terá o resultado.

Dilma fez um discurso que, segundo jornais (não ouvi, nem li), divide o Brasil entre nós e eles. Não é primeira vez que isto acontece no PT. Lula fez a mesma coisa. Meu pai, loiro de olhos azuis, é um dos inimigos deste país, segundo Lula. Eu tenho perfil europeu, portanto devo ser também, mesmo com as raízes que tenho. Resta saber quem eram os estudantes da boate de Santa Maria. São diferentes da população de Petrópolis, Teresópolis, Xerém... , das famílias e estruturas sociais destroçadas homeopaticamente por assassinatos e acidentes de trânsito.

domingo, 27 de janeiro de 2013

Comer bem

           Semana passada tive que ir a dois novos restaurantes ditos chiques e novos aqui nos Jardins, região nobre de São Paulo. O preço por pessoa não nega: R$ 75,00, sem couvert, entrada ou qualquer bebida especial. São, de fato, ditos chiques, seja lá o que hoje em dia signifique isto. Prato principal, um suco num, uma cerveja long neck noutro, e uma sobremesa para dois nos dois restaurantes; nada além, exceto o preço, R$ 75,00. Os dois restaurantes, novos, bem decorados, organizados e bem servidos, bem ao gosto da nossa classe emergente em sua busca quase desesperada de ser chique.

Mas... e gosto, o sabor, a qualidade da comida? Ao final das contas é o que realmente vale. Ou não?

                No primeiro comi um gnochi trufado, que se não me engano custou R$ 46,00 o prato. Estava bom, servido (ou perdido) num lindo imenso prato fundo decorado, mas horas mais tarde continuava me acompanhando. No segundo um bacalhau, R$ 51,00, que não estava tão bom e horas depois também me fazia companhia, não o bacalhau, mas o excesso de azeite. Tenho companhias melhores para passar à tarde comigo, que além de tudo e felizmente não me doem no bolso.

Restaurantes como o quilo barato (R$ 25,00/quilo) da Sandra, do Estação Pinheiros, visinha de minha casa, tem vários sabores maravilhosos, como por exemplo a salada de berinjela miudinha ou a acelga com gengibre e pimentão picadinho; e o quilo do Gustavinho, República Gastronômica, um pouco mais caro, mas também de excelente sabor geral, principalmente no dia “árabe” (quinta-feira, creio), são bom exemplo que comer é uma coisa, pagar por frescura é outra.

Saber cozinhar para valer é um dom para poucos, bem poucos. Outros se tornam bons porque se auto disciplinam e se auto educam para o bom sabor. Trabalham sua própria sensibilidade. Entendem a importância de seguir passos, respeitar regras, dentre elas saber degustar. O desenho animado Ratatouille descreve genialmente o que digo.

O fato é que boa parte destes chefes que ai estão servem os próprios egos. A cultura de paladar que tem provavelmente é precária ou viciada. Quantos deles tiveram a possibilidade de comer a comidinha caseira. Dos poucos que tiveram esta oportunidade, quantas famílias tiveram acesso a ingredientes bons, a tranquilidade para cozinhar, a tempo para servir bem, degustar em paz?

O pior mesmo é o público que se sente feliz em ser enganado. Esta é o pior de toda esta história.


 
Em Alachati, no Mar Egeu, Turquia, provei um dos melhores restaurantes de minha vida. Quatro mulheres simples tocam o negócio que tem zero de engana bobo. É uma porta numa casa pequena, simples, com uma mesa grande no meio da sala onde ficam os mais de 10 acompanhamentos para o carneiro ao alho e arlequim que fica no forno. Pedi todos acompanhamentos, feitos de legumes e verdes, e comemos numa das mesinhas na rua. Simplesmente prefeito. Suave, leve, com cada gosto bem definido, misturas equilibradas, tempo de cozimento exato. Perfeito. Gostaria de ter dinheiro para um dia voltar. Vale a pena. Como gostaria de voltar a comer o ovo estalado do Salumeria Rose de NY (Amsterdam próximo à Broadway). Custa, mas vale cada centavo. E tantos mais. Mas gastar dinheiro com estes pseudo chefes daqui não dá, definitivamente não dá.

Numa das vezes que fui para Buenos Aires em ônibus, no meio do nada da Província de Entre Rios e perto da hora do almoço, o motorista parou no acostamento e perguntou aos passageiros se queríamos desviar da rota para comer a melhor milanesa da Argentina. Aceitamos e de fato comemos milanesas com salada colhida no quintal (alface, rúcula, tomate e muita cebola, bem picados e temperados na terrina) que estava divino. O motorista sumiu. Reapareceu com aquela cara indisfarçável de quem tinha dado uma ótima trepada com a dona do pequeno restaurante no meio do nada. Milanesas inesquecíveis!

Minha mãe, que adorava cozinhar, estudava o assunto e criava pratos maravilhosos, fazia um suflê de polenta perfeito que mesmo respeitados chefes não conseguem repetir. Meu pai está aposentado e hoje se dedica aos maravilhosos jantares de terça-feira. O bouef bourguignon dele, resultado de praticamente 24 horas de forno e fogão, é insuperável aqui ou mesmo na França. Infelizmente nunca mais vou comer a perfeita batata palha feita na hora na casa de tia Nene, a torta pasqualina da querida Maria, as milanesas perfeitas com salada de Yaya, o almoço de Natal dos deuses de Dona Marta Falzoni (mostarda de Cremona, creme de trufas, talharins, pudim de alcachofras, mouse de chocolate amargo), o arroz seco e solto, o feijão preto e a couve milimétrica suavemente passada no alho de Mariazinha, os pasteizinhos de queijo delicados de (tia) Milão, o bolo de nozes quebradas na hora de minha irmã, a geleia de mexerica do rio feita em família, as sopas de resto de Silvia... Posso dizer que tenho uma boa base de cultura culinária.

 

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Cornowagen Brasil




Começo esta com o Corno Wagen, ou Cornowagen, como queiram. Pois bem, a Volkswagem do Brasil lançou em 1965 uma grande novidade, ideal para o tempo quente e ensolarado deste país tropical: Fusca com teto solar. Não demorou nada e logo o carrinho foi apelidado de “corno wagen”, provavelmente por algum pasquim de bêbados metidos a inteligentes, enrustidamente temidos e invejados. E assim as vendas simplesmente acabaram. Primeira definição do que somos, brasileiros.
Carro preto sempre foi símbolo de carro de poder, nem sempre muito honesto. Vide filmes de gangsteres e máfia, donos pouco corretos do poder, ditadores; enfim, de gente que não se pode definir como sendo exatamente “do bem”. Segunda definição do Brasil: a cor mais vendida neste país campeão de injustiças sociais foi durante décadas (e talvez continue sendo) o preto. Muito sensato, principalmente quando usado debaixo do discreto sol que nos abençoa. Terá este fato qualquer relação sociológica com nossa tranquila aceitação da epidemia criminal que nos assola?

Definição de Brasil terceira: num Bom dia Brasil, creio que do dia 02 de Janeiro passado, foi dito que o pessoal que voltava do Litoral Sul de São Paulo para a Capital e Região Metropolitana chegou a fazer a viagem de carro em 12 horas. A notícia não foi mais repetida neste termo por que as 12 horas foram abatidas para só 6 horas de viajem. Melhorou muito, principalmente numa estrada que simplesmente não tem postos de serviço. Fiz a viajem outro dia em aproximadamente uma hora e meia. Socialismo que nunca antes... Isto tudo tirando fora o altíssimo índice de inadimplência dos zero sem IPI e os pátios onde não entram os mais de 200 mil veículos apreendidos...
Acelera Brasil! Pé na tábua e fé em Deus.
Feliz Ano eternamente Novo, Brasil 2013

(Fica a recomendação para a leitura do “Pé na tábua e fé em Deus” do Antropólogo Roberto Damatta. o qual ainda não li, mas está na fila)